Recife precisa de doze torres e centros comerciais para ser novo?
Ou o que há de novo na articulação entre a truculência policial e arrogância do capital?
Por: ITAMAR LAGES*
Ainda que a reintegração de posse do Cais José Estelita tenha seguido todos os trâmites legais, o uso da força policial em um verdadeiro aparato de guerra merece a nossa explicita reprovação. O que está em jogo não é apenas a garantia do direito à propriedade, como bem reza a Constituição Federal vigente, mas, sobretudo, a ocupação desigual da cidade atendendo exclusivamente aos interesses do capital.
É fato que a Lei Magna protege a propriedade privada, mas também é verdade que a mesma Lei protege a articulação, o diálogo e a participação social. Ou seja, o cumprimento da Lei não priorizar apenas, como já disse, o interesse do capital, mas, também, o uso do espaço público para o público.
Em nenhum momento nesse período verificou-se a disposição de políticos, e de grande parte da imprensa pernambucana em estabelecer um diálogo entre os grupos que pensam maneiras diferentes de ocupação do Estelita. Há pelo menos dois dias viu-se na imprensa opiniões e dados estatísticos favoráveis às ideias do Consórcio Novo Recife. Todavia, as velhas práticas, de decisão foram as que predominaram, visto que as opiniões e estatísticas favoráveis à ocupação do público pelo público, não teve, nem ao menos nesse período, o mesmo tratamento. Com a divulgação do apoio ao Consórcio Novo Recife, se buscou uma justificativa para a violência perpetrada pela polícia, como está estampada nas edições de hoje dos jornais pernambucanos.
Por que os dirigentes públicos do executivo, legislativo e judiciário, as lideranças políticas e econômicas não cumpriram o papel de estabelecer um fórum entre as ideias do Consórcio Novo Recife e as do Movimento Ocupe o Estelita? Por que na hora de seguir a legalidade só vale o aspecto financeiro e o debate de ideias é rejeitado? Por que usar uma força policial para surpreender no início da manhã, pessoas desarmadas que usam como instrumento apenas o próprio corpo? A legalidade não consiste também proteger as pessoas que têm ideias contrárias? Com essa ação policial e a defesa das ideias do Consórcio Novo Recife, os grupos dirigentes estão investindo na coesão social? Na paz? Na boa convivência entre os que pensam de maneira diferente a ocupação do Recife e dos espaços públicos? O Recife precisa de doze torres e centros comerciais para ser novo? O que há de novo nisso? O que há de novo na articulação entre a truculência policial e arrogância do capital?
A democracia foi ferida mais uma vez. Os responsáveis devem pedido de retratação e redefinição de atitude política. Isso é o que se espera!
Itamar Lages é professor da FENSG e presidente da Adupe