Pacote legaliza centrais sindicais e cria novo conselho tripartite – Publicada em 09.05.2006
Medidas provisórias assinadas pelo presidente Lula definem regras para a legalização das centrais sindicais e criam o Conselho Nacional de Relações do Trabalho (CNRT).
André Barrocal – Carta Maior
BRASÍLIA – A difícil negociação entre trabalhadores e empregados, patrocinada pelo governo, para se construir uma relação capital-trabalho menos desequilibrada no Brasil – desequilibrada para os trabalhadores, ressalte-se – já produzira consensos no Fórum Nacional do Trabalho (FNT) que, no entanto, ainda estavam longe do mundo real. A reforma sindical que o Fórum preparou foi enviada à Câmara em março do ano passado, mas empacou por resistência de alguns setores patronais e sindicais. A paralisação brecou idéias consensuais que, finalmente, ganharam vida nesta segunda-feira (08). Em cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente Lula assinou medidas provisórias (MPs) que legalizam as centrais sindicais e criam o Conselho Nacional de Relações do Trabalho (CNRT), formado por empregados, empresários e governo. O Planalto também mandou ao Congresso projeto que regulamenta cooperativas de trabalho, a fim de impedir que sirvam para suprimir direitos.
Maior central brasileira, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) considerou o pacote uma tentativa de “humanizar” as relações capital-trabalho. “O mundo do trabalho no país é profundamente perverso e autoritário. Quando o governo edita medidas dessa natureza, humaniza um pouco mais essas relações”, disse o presidente da CUT, João Felício.
A legalização das centrais foi apontada por sindicalistas como o ponto mais importante do pacote. Embora elas já sejam, na prática, entidades representativas, carecem de respaldo legal. Até hoje, atuaram como uma espécie de organização não-governamental (ONG). Nada obrigava o governo a assentá-las em instâncias como o FNT ou o patronato a aceitá-las em negociações. “Elas dependiam de boa-vontade. Agora [com a MP], não”, afirmou Osvaldo Bargas, que foi coordenador-geral do FNT e hoje chefia o gabinete do ministro do Trabalho, Luiz Marinho. “Consideramos uma vitória que se busca desde Getúlio Vargas”, declarou o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.
A legitimação das centrais vai reforçar-lhes o poder de negociação – e, em conseqüência, dos trabalhadores em geral – nos embates com o empresariado. Por isso, setores patronais já protestam contra a idéia. Em nota distribuída nesta segunda-feira (08), a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomércio) criticou a proposta. E deixou claro o motivo: prefere interlocutores fracos. “Se as centrais sindicais tornarem-se agentes negociadores, isso dificultará os acordos coletivos, que levam em conta as necessidades e características regionais”, disse a nota. Curiosamente, o presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Antonio Oliveira Sales, participou da solenidade no Planalto, mas não fez nenhum reparo à proposta.
Atualmente, 17 entidades declaram-se “centrais” ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Para conquistar a chancela de fato, terão de se enquadrar nas regras definidas na MP: filiação mínima de 100 sindicatos, sendo ao menos um de cada região do país e em cinco setores econômicos diferentes; além disso, cada sindicato filiado deverá ter ao menos 10% dos empregados sindicalizados do setor. Pelo critério “filiação mínima de 100 sindicatos”, só cinco das 17 entidades, sobreviveriam – CUT (1558 filiados), Força Sindical (607), Nova Central Sindical de Trabalhadores (427), Central Geral dos Trabalhadores (146) e Social Democracia Sindical (145).
COOPERATIVAS DE TRABALHO
No pacote trabalhista anunciado nesta segunda-feira (8), o presidente Lula despachou ao Congresso um projeto que regulamenta o funcionamento de cooperativas de trabalho. O governo vai reconhecê-las, defini-las do ponto de vista legal e estimular sua criação formal. São dois objetivos básicos: (1) evitar que as cooperativas permitam ao patrão que as contrata sonegar direitos trabalhistas aos funcionários e (2) apoiar aquelas montadas legitimamente por trabalhadores marginalizados (catadores de lixo, por exemplo). Para cumprir a segunda meta, está prevista a criação de um programa nacional de financiamento às cooperativas com dinheiro do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
As medidas do pacote
CENTRAIS SINDICAIS: Ganharão legitimidade para representar seus associados e, com isso, poderão participar de negociações coletivas no âmbito nacional e representar seus filiados perante a Justiça. Essas entidades hoje não fazem parte da estrutura sindical. Para serem reconhecidas, as centrais terão que ter, no mínimo, cem sindicatos filiados, distribuídos nas cinco regiões do país e representar pelo menos cinco setores da atividade econômica.
CONSELHO NACIONAL DE RELAÇÕES DO TRABALHO: Será formado por representantes dos trabalhadores, empregadores e governo, e ficará no âmbito do Ministério do Trabalho.
COOPERATIVAS DE TRABALHO: Essas entidades não poderão ser criadas para fins exclusivos de intermediação de mão-de-obra. Elas terão que distribuir mensalmente aos seus cooperados (que são sócios) pelo menos o piso salarial da categoria e realizar assembléias periodicamente. Caso seja comprovado vínculo empregatício, haverá a dissolução da entidade, além de sanções penais e pagamento de multas. Será criada linha de financiamento destinada às cooperativas, que poderão ser formadas com cinco cooperados.
PARTICIPAÇÃO NAS ESTATAIS: O governo pretende baixar um decreto que permitirá aos trabalhadores de estatais indicarem representantes nos conselhos de administração das empresas.
GREVE NO SETOR PÚBLICO: O Ministério das Relações Exteriores deverá enviar ao Congresso comunicado com a adesão do Brasil à norma da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que reconhece o direito de greve aos funcionários públicos.
TRABALHO AOS DOMINGOS E FERIADOS: Ainda em negociação no governo, a idéia é enviar projeto de lei ao Congresso que regulamenta o funcionamento do comércio aos domingos e feriados.