Democracia e gestão compartilhada – Por Itamar Lages
Itamar Lages*
Na reunião do Conselho Universitário da Universidade de Pernambuco (CONSUN), realizada em 29 de fevereiro passado, a ADUPE apresentou e defendeu a proposta de permanência dos diretores do HUOC durante os trabalhos investigativos da Comissão de Inquérito, instituída por ato administrativo do Reitor Carlos Calado. Faltou apenas um voto para que a proposta do sindicato aprovada. O fato suscita a necessidade do debate sobre qual modelo de gestão pretendemos para nossa universidade.
Ao defender a proposta de permanência dos diretores eleitos do HUOC durante os trabalhos investigativos da Comissão de Inquérito, a ADUPE convidou os conselheiros e a comunidade universitária a aproveitar a oportunidade e investir no fortalecimento dos mecanismos de gestão compartilhada entre os ordenadores do poder central e daqueles que estão nas Unidades de Ensino e nas de Saúde. Esse investimento pode ser feito, inclusive, aproveitando os trabalhos da Comissão de Aprimoramento do Modelo de Gestão da UPE, recentemente instituída. Além disso, ao final do prazo regulamentar, a Comissão apresenta seu relatório e a UPE apresentaria à Sociedade as medidas cabíveis.
O fato é que a situação enfrentada pelos gestores afastados do HUOC pode ser tomada como um caso exemplar de uma situação que cotidianamente é vivenciada pelos ordenadores de despesas da UPE: o enfrentamento isolado de exigências administrativas e jurídicas. Esse é que o verdadeiro e intenso risco.
Essa situação ocorre porque os necessários mecanismos de coordenação integrativa da gestão da UPE – Reitoria, Unidades de Ensino e Unidades de Saúde – parecem estar ainda muito incipientes e, consequentemente, frágeis. Assim, os assuntos administrativos de uma Instituição única, porém fisicamente dispersa pelo Estado de Pernambuco, terminam sendo tratadas conforme os recursos isolados de cada dirigente.
Esse modo de administração, além de ameaçar a característica descentralizada da UPE, faz com que a Universidade esteja vulnerável às injunções privatizantes, como a de entregar a gestão dos hospitais universitários a empresas privadas, que se auto-definem como organizações sem fins lucrativos. Aqui em Pernambuco, por exemplo, o acesso aos serviços de saúde tem sido ampliado de acordo com um modelo linear de queixa-conduta administrado por proprietários de serviços chamados de filantrópicos, em detrimento do que preconiza a atual Constituição Federal: em primeiro lugar o Estado.
O atual estatuto da UPE preconiza a descentralização horizontal e vertical como uma das principais características de configuração da estrutura administrativa da nossa Universidade. Entendemos a descentralização como o parâmetro mais complexo para o delineamento da estrutura de uma organização. Complexo porque a sua realização se exprime na dispersão dos serviços pelos distintos Campus e Unidades a fim de atender à população pernambucana. Complexo porque a descentralização dos serviços exige que sejam viabilizadas as condições necessárias à realização das atividades e a obtenção dos resultados esperados.
Isso significa que devemos fortalecer a descentralização nos sentidos horizontal e vertical. Significa que a grande estratégia para isso é a de fortalecer a reunião entre os ordenadores de despesas como uma Câmara Técnica na qual a dificuldade de cada Unidade passe a ser tratada por todos os ordenadores. Que as propostas saídas dessa Câmara sejam submetidas à apreciação e deliberação do CONSUN. Que uma das decisões pontuais, mas muito importante, seja a de ter um corpo de auditoria próprio que realize suas atividades no início e no final de cada mandato. Que no caso de um impedimento temporário ou definitivo alguém que esteja mais próximo dos processos em execução dê continuidade às atividades de coordenação administrativa e que, por outro lado, os ordenadores máximos da UPE possam garantir a mediação dessa dinâmica para evitar solução de continuidade.
Ora, para que estas propostas possam ser devidamente encaminhadas é preciso que a prática do diálogo faça parte do cotidiano institucional. Essa prática nunca deve ser efetivada de maneira instrumental, mas sim contando com a possibilidade de contraditórios, os quais terminam por fortalecer as mediações e as tomadas de decisões mais difíceis como a que vivenciamos agora. Essa proposta e esses encaminhamentos, se adotadas rotineiramente, podem evitar os constrangimentos institucionais e pessoais dos processos administrativos. Com isso, em vez de “quebrar, se promoverá o fortalecimento do poder dos diretores”. Um poder que não se constituirá em distinção pessoal, mas sim na responsabilidade compartilhada!
* Itamar Lages é professor da FENSG e presidente da ADUPE